Museu Salazar

A 23 de Julho de 2008 era publicado este texto de minha autoria no semanário Contacto, com reedição no boletim trimestral da URAP – União de Resistentes Antifascistas Portugueses. Nessa altura julguei, inocentemente, que nunca mais teria que o voltar a procurar.

Mas o Fascismo tem raízes profundas e não é fácil de erradicar. Resta-nos, a cada vez que desponte, remetê-lo de novo ao caixote do lixo da história.

Fica aqui:

No passado dia 1 de Julho foi discutido na Assembleia da República o projecto da Câmara Municipal de Santa Comba Dão para a construção da Casa-Museu Salazar.

Este projecto remonta ao tempo em que Manuel Maria Carrilho era ministro da Cultura do Governo PS. Tempo em que Orlando Mendes (PS também) era presidente da autarquia santacombadense. Mais recente­mente o actual executivo camarário (PSD/CDS), presidido por João Lourenço, veio ressuscitar a ideia do antigo autarca.

Mas se este nunca foi um projecto pacífico, ganhou recentemente contornos menos claros. Desconhece-se mesmo qual o objectiva e real interesse de tal projecto. No início Museu Salazar, depois Casa-Museu Salazar, mais tarde Parque Temático Salazar e agora Centro de Estudos do Estado Novo. E todos estes nomes no espaço de um ano.

Mais caricato é o espaço “museológico” que a Câmara detém para rechear o museu, “doado” (a troco de uma renda vitalícia de 2.000 euros por mês) por um sobrinho neto do antigo governante do Vimieiro. Nas palavras de um assessor de Joao Lourenço há: chinelos, estojo da barba, pente, restaurador Olex, discos da Amália e outros tarecos do género. De material de interesse histórico nem um item. O espólio político encontra-se na Torre do Tombo e os poucos documentas que estavam na casa do Vimieiro foram há alguns anos entregues à Universidade Católica.

Não se pode negar que o homem que mais importância teve no século XX-em Portugal foi Antonio de Oliveira Salazar. Que o digam as largas centenas de milhares de portugueses que se viram forçados a emigrar para poderem fazer as suas vidas, muitos aqui para o Luxemburgo. Vidas que em Portugal estavam condenadas a miséria e à opressão. Com medo de agir, medo de falar, medo até de pensar. pois a cada esquina espreitava a PIDE e o seu exército de bufos que, tal e qual Judas vendiam vizinhos, amigos e até família por quaisquer 30 dinheiros. E para os homens acrescia a ameaça da ida para a guerra: quatro anos por terras de Africa. Centenas de milhares de jovens voltaram traumatizados e estropiados para a vida. Muitos nem sequer voltaram, pagando com a vida uma aberrante política colonialista.

Outros ainda, não tendo ido à guerra sofreram na pele a violência dos «safanões a tempo» que a PlDE administrava aos que se recusavam a aceitar a ditadura fascista. Foi um desses «safanões» que matou Humberto Delgado, outro que matou o pintor Dias Coelho, e muito outros. Foram os «safanões» que espancaram, torturaram, humilharam e encarceraram milhares de portugueses.

E tudo sob o olhar atento e complacente do ditador de Santa Comba Dão. A Assembleia da República discutiu e entendeu, por larga maioria (com os votos contra do PSD e do CDS), que o projecto do Museu ou lá o que lhe queiram chamar, mais não pretende criar um relicário àquela que foi a mais ignóbil e vil figura do século XX em Portugal.

Ao invés deste altar faça-se um espaço de memória para que os vindouro nunca se esqueçam do que foi o regime fascista e estejam atentos e informados o bastante para, mal comece a surgir, impeçam outro Salazar de se levantar.