Derrota do Fascismo

Passam hoje 75 anos sobre a derrota do Fascismo naquela que foi a maior guerra a jamais assolar a Europa e o mundo. Numa época em que o nacionalismo e o ódio estão novamente em ascensão e quando há um desejo crescente de misturar o comunismo e o nazismo como se fossem dois lados duma mesma moeda, a leitura daqueles que mais promovem essa ideia, visto esforço constante que mantém para passar essa distorcida mensagem da história, é uma obrigação. Perceber por onde passa a rescrita da história.

O livro Bloodlands (terras sangrentas), de Timothy Snyder, apresenta-se como a “história das pessoas mortas pelas políticas de líderes distantes”, mostrando como a área entre Moscovo e Berlin foi um terreno de matança para os regimes nazi e soviético. E que assim foi em termos iguais. Snyder passa a comparar as mortes, nessa área específica (actualmente nos Estados Bálticos, Polónia, Bielorrússia e Ucrânia), tanto da União Soviética (para o período de 1933 a 1945) como do Terceiro Reich (de 1939 a 1945). Sim … os períodos em análise não correspondem… detalhes.

No seu Prefácio, podemos aprender que, excluindo aqueles tombados na frente de combate, houve um total de 14 milhões de civis mortos. “Dos 14 milhões de pessoas assassinadas deliberadamente nas terras sangrentas entre 1933 e 1945, um terço [o que daria 4,7 milhões] pertence à conta soviética” (nenhuma referência é feita aos outros 2 terços de forma agregada). De 1933 a 1945. E a contagem começa. Utilizei como única fonte de informação prefácio deste livro de Snyder, esse grande divulgador dos crimes soviéticos.

Lado nazi:

  • 5 milhões de judeus [nota: nenhum outro grupo social é mencionado – religioso, étnico, político, etc. – e Snyder parece não se importar que esta contagem seja curta por um milhão];
  • 3 milhões de prisioneiros de guerra soviéticos (mortos à fome);
  • 1 milhão de cidadãos soviéticos (de fome, durante o cerco de Estalinegrado);
  • 1 milhão em campos de trabalho (sem referência a grupos sociais ou nacionais);
  • Total de 10 milhões.

Lado soviético (nunca há uma enumeração clara):

  • 3 a 4 milhões em Holodomor [nota: a grande fome Ucrânia – voltarei atempadamente a este assunto]
  • Mais adiante, Snyder diz que “na Ucrânia soviética, na Bielorrússia soviética e no distrito de Leningrado (…) o regime Estalinista matou de fome cerca de 4 milhões de pessoas nos 8 anos anteriores [antes de 1941]”. Isso inclui os 3-4 milhões no Holodomor.

Não há, no Prefácio, nenhum outro relato de mortes perpetradas pelos soviéticos nas terras sanguíneas durante o período em questão. Ainda assim… os números soviéticos aparecem mencionados três vezes mais frequentemente nessas 12 páginas. Nas terras sangrentas (Blood lands), a área mais mortífera da Europa no século XX, os nazis mataram, sempre seguindo o relato de Snyder, mais do que o dobro dos soviéticos, só que o fizeram em metade do tempo. E os mortos inscritos na responsabilidade soviética são, na sua quase totalidade, os do Holdomor. Há hoje literatura científica (revista por pares) ocidental mais que sobeja que desmente a tese da participação pela negativa na grande fome de 1932-33. Pelo contrário, o conhecimento científico-histórico que se tem dessa época, e das fomes cíclicas que até 1933 sempre assolaram a região, apontam para uma intervenção preventiva e redutora dos efeitos da fome, a expensas de outras partes da União Soviética. Mais ainda, sabemos hoje que meia dúzia de anos antes uma outra fome, bom mais mortifiera, teve lugar na mesma região do globo sem que isso tenha nunca sido alvo de tanto alarido. Mas como dito acima, voltarei atempadamente a este tópico.

Quando a equalização dos regimes nazi e soviético é resultado de uma análise tão “honesta” e “isenta”, devemos começar a fazer perguntas sobre o real interesse por trás dessa tentativa.